Os olhos ausentavam-se nas encostas risonhas dos meus montes com rugas em regatos cantantes e alegres, fugindo ao encontro dos botões das giestas e aromas de rosmaninhos.
Nos cabelos atrevidos e esvoaçantes dos choupos, penduravam-se rouxinóis
vestindo penas de primaveras meninas, em êxtases de cantos embriagantes,
repercutindo-se em ecos nos montes de nuvens dispersas no azul sereno e
transparente do Vazio celeste.
O vento indeciso, leve, era a vibração que acordava esta alegria interior,
num lago de anónimas águas, num mutismo contemplativo.
Pensamentos mergulhavam de encontro aos seixos redondos em amêndoas
coloridas.
Neste espelho mudo, as recordações aninhavam-se nos ovos de tingidos e penachos
amarelos em jardins de Páscoa e começavam a sorrir embaladas no sono da
saudade.
O canto do rouxinol ondulava nas curvas do pensamento, percorrendo agora a
paisagem colorida das glicínias, numa canção enternecedora e tranquila, escrita
em memórias de sinos pascais.
E como uma nuvem, deixei-me envolver nesta melodia, flutuando nas
recordações que se teciam também na saudade dos meus vestidos rodados de crepe
e laços de seda.
Uma imagem se criava em mim, recordando a Vida na morte do Filho do Homem.
Na cortina do tempo, abro hoje a janela, sorvendo a Páscoa do meu dia, na
Paz que se faz em mim.
Em alegria.
Assim.
Manuela Barroso