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quinta-feira, 4 de abril de 2019

Simplicidades


 Vladimir Volegov

Era cedo na tarde do dia.
O sol pousava placidamente os olhos nos galhos secos e velhos na vida acabada de morrer.
Aves fugidias procuravam refúgio nas folhas ainda por nascer.
Perto, nos ramos verdes do sobreiro e dos abetos, o chilreio intempestivo já tem sabor a primavera , mas ainda vadia...
O inverno longo e cansativamente frio, transporta-nos para recantos amenos onde acolhemos o pensamento em divagações, perdendo-nos nos ramos com o gorjeio dos pardais.
O prazer de estar, confunde-se com a existência de Ser.
Apenas se saboreia o tempo que discretamente acompanha o bater do coração, o suave” in” e “ex” da respiração.
Paro para me escutar.
A vida que carrego ou me carrega a mim, sinto-a em cada parte, em cada o órgão que transporto.
Quero permanecer neste mutismo, saborear este aconchego de mim, não pensar, rejeitar renitentemente qualquer interferência que interrompa o meu comodismo...
Os olhos fixam as folhas.
A brisa, muito fresca e muito leve, vai tagarelando, só para dizer que há vida no ar, no pólen, no pó, no ruído, no silêncio...
As folhas obedecem a este ritmo balouçante, num murmúrio constante e trémulo.
Eu... permaneço imovelmente sentada, só condescendo com o leve sacudir da minha écharpe, com a ténue carícia nos meus cabelos.
Algo me perturbou...
...como se o olho perturbante e intenso entre as nuvens me despertasse: Tudo obedecia ao fluir deste rio imenso que palpitava vida, deixando-se acariciar ou tocar ou mudar de rumo.
Mas eu não.
Comodamente intransigente...
As nuvens... abrindo estradas aos reflexos intensos; as folhas... deixando-se balouçar com a brisa; os pássaros... indiferentes ao vento e ao sol, continuavam com o seu trinar instintivo a saudar a vida, e eu, renitentemente sentada, insistindo no meu egoísmo, concentrada no meu mundo, não permitindo interações...
Caí em mim.
Como me senti pequena e intolerante, perante o exemplo das folhas que sorriam e dançavam nesta comunhão com a Natureza!
Escutei em mim os segredos da vida...
...mundo que não é só meu, e com o qual, tal como as folhas, tenho que aprender a saber dançar a valsa do vento!
Levantei-me.
Procurei adaptar-me à aragem aproveitando o ritmo, o exemplo e o conselho das folhas...
 E fluí com o vento.
Como o vento!


 Manuela Barroso