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sábado, 12 de dezembro de 2020

Ainda Ouço

 

 foto minha

 
Quando o sonho se torna um pesadelo, quando as poucas  résteas que sobram, ensombram ainda mais os nossos dias, embarco na imaginação e faço o percurso do"faz de conta"no filme  das minhas recordações.

E...

...ainda ouço os rumores vazios das noites quentes de verão.

Queria volatilizar a saudade das vozes frescas das crianças, na poeira da estrada.

Queria poder esquecer o chiar dos carros de bois naqueles estios dolentes, arrecadando urze, tojo e flores silvestres que se deixavam arrastar pelo suor demolidor de corpos cansados.

Queria voltar à sombra da minha tangerineira com persianas de flores escorrendo pólen, suavizando a alma de perfume, enchendo os olhos de perguntas  que eu guardava na concha das mãos.

Sobram as paredes sujas do tempo, as fontes secas de águas desviadas, o jardim solitário de uma multidão de pétalas, a geometria desfeita dos canteiros que contornavam as minhas rosas.

A sombra persegue-me num espelho de recordações que me vão morrendo, abafando os alicerces da infância.

Já não ouço as poupas, as rolas e o cuco, música que me embalava nestas tardes mornas subindo pelos troncos das glicínias.

Não lhes dão tempo de migrarem. Com as  sementeiras de pesticidas, tiram-lhes o voo e a voz. 

Com eles os grilos e as cigarras. 

Mas...

...afinal onde vai o meu devaneio ? No ponto de partida...porque a alma está ferida.

Hoje, abandono-me num canto que me acolha.

E espero, paciente que alguma alegria  me recorde, volte e me recolha.

 

Manuela Barroso


 

 


terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Não Me Perturbes

 

Foto Minha



Quero reclinar o meu peito no regaço da terra
descer num casulo de luz pairar como a bruma
na urze calada e perfumada da serra.
 
E não perturbes o meu silêncio
que dorme nas folhas das minhas mãos.
 
Na criança adormecida em mim
ficam as pegadas na presença dos silêncios,
nos diálogos e gestos escritos na areia polida
das minhas palavras.
 
E não perturbes o meu silêncio
que dorme nas folhas das minhas mãos.
 
Não perturbes estas folhas que rodeiam o meu corpo
povoando esta alma de música que ninguém ouve.
Não quero miscelâneas no meu poente.
Quero nascer os olhos em bocas de alegria.
Deixa ser-me criança, vestir de novo esta fantasia.
 
E não perturbes o meu silêncio
que dorme nas folhas das minhas mãos.
 
E não per_ tur_ bes o meu son_ ho.
Quero adormecer a noite enganar a lua
morrer o passado nesta inquietação
desta
chama
nua.

 

Manuela Barroso

 

https://vimeo.com/84500122

( Video-"Não me perturbes"- Na maravilhosa Voz de Rui Diniz)

   





sábado, 14 de novembro de 2020

Abre a porta

               Duy-Huynh
Abre a porta.                                 
Ouvi -te nas grutas e em buscas dementes.
Ouvi a corrosão da tua insistência que atormenta o silêncio do meu sono e das noites que me pertencem.
Hoje trago-te a minha leveza invisível na poeira que se faz luto.
Trago-te a vingança de desatinos que o Homem volta a esquecer.
Abre a porta.
Agora é o tempo de acordar toda a Terra, cercá-la de sombras e acordar a afronta e a indignidade de usurpadores e déspotas que acorrentam vidas humanas e toda a criação, na ganância dos seus sonhos devoradores e bárbaros. Não são mais que simples sopros que se desvanecem no algodão negro das suas lucubrações efémeras.
Abre a porta.
Hoje trago a vingança dos morcegos no incêndio de noites moribundas. O meu ninho é o espaço esconso de ninguém. É o caminho deserto das sombras onde as moléculas navegam em desconhecidas constelações. Respeita-os
 
Só fecharás a porta, com a libertação da Terra e de tudo quanto nela habita.
Ela é o receptáculo que te embala, a corola que te sorri, acredita.

 
Manuela Barroso

 


domingo, 1 de novembro de 2020

Hoje

                       Da net
Hoje, não cantes a primavera que nasce nos outeiros.
Chovem outonos em mim com folhas secas pelo meio.
As rosas perderam a cor,
os lírios perderam asas
as aves perderam chuvas de penas, na pena do desamor.
O sol emudeceu a luz,
as nuvens já não cavalgam no céu.

 
Quero tréguas neste trepidar da calma
que foge, que me arrasta.
Deixa uma vez, a solidão morar comigo
na casa que construiu
nos marfins das noite sem estrelas.
 
Quero a paz da luz, a alegria da noite no refúgio
da solidão.
Quero ninhos no silêncio das alvoradas,
acordar no linho dos lençóis
despertar com  o sorriso do orvalho
na frescura das  madrugadas.
 

Manuela Barroso

 

 

 

 

 


domingo, 18 de outubro de 2020

Tarde de Outono

 Eileen  Goodall
 Uma tarde quase primaveril.
Pequenos nadas que se tecem no pensamento, que fazem parte da rotina do tempo, das estações que vêm, que vão.
Os raios de sol caíam luminosos nos braços das árvores, agora desenhados na laje do chão, onde se amontoam folhas secas, mortas, quase desfeitas...
...Era um ritual pachorrento, cuidar da folhagem que ia caindo... caindo a cada sopro de vida no vento.
...E a folha caía, caía...
… caiu... caiu e foi apodrecendo num grosso tapete uniforme e quanto mais o tempo corria...o tapete ia reduzindo o seu corpo, entregando-se ao chão, à terra.
E as folhas secas e hirtas do carvalho e do meu sobreiro, mirravam como os dias pequenos do inverno, não sobrevivendo às chuvas, às intempéries...
Olhei o chão... olhei o céu...olhei a folha...
...Olhei os ramos hirtos numa espécie de clemência à vida...
Fez-se silêncio cá dentro...
Algo bateu fundo, forte...numa profunda inquietação na quietação do meu "eu"...e tudo ficou mais denso, mas mais verosímil com as (in) congruências da Vida.
"Tu és como a folha...
És um rebento que cresce, onde pousam as aves, embelezas os jardins e os bosques com o charme da tua cor, com a majestade da tua essência...
E vives e és feliz como os pássaros que abrigas...e és útil com a tua sombra.
Mas, oh impermanência do tempo...um dia cais como a folha seca...mirrarás sem força, sem vida como a folha, outrora verde e viçosa…e o espaço que ocupavas antes, vai crescendo à medida que vais perecendo, até ficares em nada..."
Os olhos ergueram-se numa não-aceitação deste pensamento como se esperasse outro reduto onde me pudesse refugiar...
E senti que numa hipotética semelhança com a folha, enquanto massa apodrecida e inerte na laje  eu era...sou uma  outra folha…
Eu penso que penso...eu não sei se ela pensou...
Eu penso que estive enquanto estou...e pensando que um dia não estarei mais, mas deixarei a minha voz no vento em palavras porque deixarei a minha voz  algures nos símbolos.
E se Além houver” folhas” também!?
A folha e eu...
A folha e tu...
...Mas a primavera voltará, com novas folhas, novos sorrisos...
...E eu quero o Agora...o outono do Hoje...a primavera que voltará.
Mas...e a folha que eu sou?


Manuela Barroso
(reeditado)

sábado, 19 de setembro de 2020

Bem - vindos!


Depois de uma pausa procurando o afastamento  destes grilhões que aferroam corpo e alma, convido-vos hoje, a ouvir um vídeo que tentei fazer, embora com  detalhes do meu reduzido saber informático.  Mas sou  a voz e o afecto que me une a todos/as vós, queridos AMIGOS/AS.
Eis-nos de novo!




                                                                         

                                                                            "O Bosque"

                                                                                         Manuela Barroso






quarta-feira, 8 de julho de 2020

Rasgava





Rasgava a planura do oceano
como quem semeia cartas ao vento.
Escondia o gemido no agasalho frio do nevoeiro
que nunca lhe fora tão límpido.
Sorriam os olhos com a corda púrpura do poente
que nunca lhe fora tão cúmplice.  

Plantou-se na terra
e nunca esta lhe fora tão cruel.


Manuela Barroso






sábado, 20 de junho de 2020

Se me disseres



Se me disseres que te apaixonas pelas flores que
cobrem as ruas das tuas mãos ou pelo austero cântico                
que atravessa as frestas na sombra das pedras,
vibrarei com o âmago da tua  adolescência.      

Nada é tão puro e cristalino e tão levianamente azul.
Nada é tão perecível como a sonolenta caligrafia  de
um sinuoso silêncio submerso no misterioso lodo das
águas. Nada é mais belo que o sibilar das folhas,
o saltitar do chapim na lucidez da manhã.

Submersos na imaginação vadia, sorvemos o bulício
que nos suspende à moldura da vida,  como corpos
abandonados  à procura de um poente.



  Manuela Barroso

quarta-feira, 3 de junho de 2020

Foi ontem


 Rumazov

Porque ainda hoje o meu estado de alma é o mesmo, um texto reeditado, feito de recordações.



 Foi  ainda ontem que o tempo não morria
na estrada da minha pele!
Os olhos atravessavam as pedras nas micas
incandescentes de agosto, cheiro a mel
E as rosas...
-ah, as minhas rosas!-
choravam as pingas de sulfato das latadas em flor!
E eu corria menina nos canteiros
com margaridas sorrindo pelo meio!
Que bom saltar à corda ,à macaca e às casinhas
não saber ler a lua nem Vénus à noitinha
correr por entre o centeio que arde
no rubro sol da herdade...
Fazer tudo
fazer nada
somente o lanche da tarde
Ah! morangos pequenos silvestres num creme
de açúcar e Porto na delícia de um recheio
da torta saída do forno e chocolate pelo meio..
E as delícias de amoras colhidas entre os picos
amansados com a língua com as pintas de salpicos?
E o sol ardia na pele e quanto mais ele batia
mais em fogo me fazia na praia do meu jardim
E nos vestidos rosa, de alça, eu mostrava a minha cor
e a graça de andar descalça na relva bordada a flores.
Ah, tardes na minha casa, meu descanso, meus jardins
que eu regava à noitinha com o canto  dos chapins.
 
E põe-se o sol lentamente
ontem , hoje e amanhã
já não como antigamente...
Hoje foge a vida  a correr
fugindo de mim também.
Mas antes também fugia
porém, com outra magia.
Agora...
Ai, agora corro tão calmamente
saboreio cada hora
que quando vejo correr
os olhos gritam...
Pára, fica, demora!..
 E dói-me a pressa
da pressa dos outros...
Dói-me ter que parar
na metade do caminho...
 Devagar que tenho pressa!


Manuela Barroso (reeditado )


domingo, 17 de maio de 2020

Era

 Jaime Best
Era de Gales o príncipe que entardecia no teu corpo.
A Primavera semeava-se na mesa com o sorriso
e a tatuagem da adolescência.

Migramos como aves clandestinas no abandono
dos  segredos à procura de um abrigo onde pousar o nosso
afago tão urgente, tão impiedoso como platónicas
são as flores onde nunca tocaste.
No tecto do teu mundo, o sol engoliu o perfume da pátria
que te esqueceu.
Que ofereças agora trevos, na intimidade da noite
e que as galáxias hoje te cubram de sossego
na penumbra da tua inquietação.


Manuela Barroso





terça-feira, 5 de maio de 2020

Maio e minhas Rosas!






Explode, mês de Maio
Faz nascer também em mim
Uma flor cada dia
E canteiros de jasmim.
Explode, mês de Maio
Rebenta os nabos das flores
Faz dançar as folhas tenras
Faz nascer também odores
Explode, mês de Maio
Também és mês de Maria
Mesmo aqueles que não crêem
Lembram, no sino, a alegria.

E se palavras tivesse
Para explodir o que sinto
O mundo seria uma flor
Um jardim feito de amor
Neste canto tão faminto.

                   Manuela Barroso




 

 Rosas Minhas


domingo, 3 de maio de 2020

Mãe


 Foto minha
Sem palavras
porque te vejo em cada canto
em cada cor
em cada paisagem
em cada flor
e em cada sol-pôr.

Mbarroso

 Foto minha




sábado, 25 de abril de 2020

Liberdade e Poesia de Graça Pires


Graça Pires

Lançamento online agora




Encontrou-o à entrada do deserto,
absorto, como se conhecesse
todas as invocações do silêncio.
Lia-se nos olhos dele a atracção pelo vento,
pelas areias, pelo espaço imenso, pela solidão.
Ela saía do deserto. O mesmo deserto.
Trazia um cacto murcho em cada mão
e um rio seco a escamar-lhe a pele.
Olharam-se. E ela contou-lhe.
Contou-lhe das vezes que se afogou no chão
pensando que era água;
como rebentaram seus lábios pela sede interminável.
Disse-lhe que quase morreu com saudades do mar;
que bebeu o próprio sangue para curar a febre e o delírio.
Falou-lhe do medo e do cansaço que venceu
cambaleando, rastejando, dormindo agarrada à noite.
Ele hesitou.
Depois, com uma quietude que só nos prodígios acontece, pegou-lhe na mão e foi com ela até ao mar.

Graça Pires- a Solidão é como o Vento
















GRAÇA PIRES, a nossa grande Poeta,  vai lançar mais um livro de histórias- poema de uma beleza fabulosa com o título “ A SOLIDÃO É COMO O VENTO”.
Uma vez que o confinamento em que vivemos actualmente, não permite que seja presencial quer em Lisboa quer no Porto, este lançamento será feito online - Facebook.
O abraço de Parabéns será virtual. Mas os seus POEMAS serão eternos.
O maior sucesso, querida amiga. 
Que o mundo literário reconheça muito mais o teu valor, apesar dos muitos e avalizados Prémios que já possuis.
Terno Abraço.

Manuela Barroso

*
O lançamento do livro “A Solidão é como o Vento” será no dia 1 de Maio no Facebook da Poética Edições.
A  Editora está a fazer uma pré-venda com 20% de desconto até 30 de Abril. É bom para quem tiver gosto em adquirir o livro.
Aqui vão os links do youtube, onde já está o vídeo, e da loja online



https://www.youtube.com/watch?v=2Z20pDs1YMY 




sábado, 4 de abril de 2020

O Céu metálico


O céu metálico sobrevoa, esta floresta de cabelos humanos, invadidos por rajadas de
medos, emparedando-os na angústia do abandono e desencanto, como berlindes ansiosos, em declives verticais, em voos  picados e  pesados de encontro ao abismo.

A solidão gela a amargura das horas com sede de vingança.
E crepita a ânsia de liberdade pela Dignidade e Igualdade Humanas.
Uma estranha prisão com grades frias, intransponíveis, feita de injustiças, ódios e metal.

A dignidade sufoca esta espuma de solidão, numa angústia asfixiante,
infligida por carrascos impunes que anulam sonhos e gritos de esperança...
A impunidade esmaga a esperança de justiça numa cortina opaca, provocando arrepios de indignação.

É neste lar terreno que o espectro da loucura humana
ganha contornos de vórtice tenebroso,
mutilando mocidades ainda por nascer.

E a dor da indignação bate surda no olhar de peitos magoados, numa amargura incontida, que acordará nas brasas das consciências abandonadas, 
feitas vulcões,  
cujas crateras vomitarão
lavas incandescentes de libertação.
E das cinzas, nascerá de novo
uma outra condição.

Manuela Barroso